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A doçura de estar fisicamente livre e a agonia de estar psicologicamente só

O corpo está mais leve. Todos os quilos agora pesam como uma cama de penas. A sensação de liberdade eleva-me ao estado mais pleno de felicidade. O vento a bater na cara tem agora o sabor que nunca antes teve. Rir nunca foi tão bom, correr nunca foi tão fácil. Agora o sol brilha seja onde for e os mergulhos no mar já não gelam, aquecem o corpo todo. As vontades foram todas recolhidas e estão agora reservadas num frasco, pronto a ser aberto. Agora tudo tem cores alegres, cheiros doces e não há dor. Não há dor. Não há dor maior que aquela de estar neste buraco. Aqui, onde a beleza paira no ar e tudo é feliz, não existe pior sensação de dor. É impossível doer mais. É impossível haver mais esperança. Não há chuva que molhe esta tremenda seca que se instalou aqui. A doçura de estar fisicamente livre mistura-se com a agonia de estar psicologicamente só. O desespero bateu no nível mais alto e rebentou para todos os lados. A ambição de felicidade nunca esteve tão forte, a liberdade nunca foi tão absoluta. E agora, faltas tu. Faltas tu em toda a sensação boa que me corrói as veias e não deixa margem para dúvidas. Faltas tu em todo o lado, e nem sequer te quero por perto. Faltas tu na felicidade que perdi em ti e que continuo à procura, sem admitir para mim própria que está completamente perdida. Agora só me resta a felicidade em que vivo, a sensação de leveza, o amor que me arde na garganta e me deixa a ansiar por mais. Por qualquer coisa. Perdi a satisfação que só encontrava em ti. Desapareceu. Sei que aquela, jamais irei encontrar. Ganhei a paz e a serenidade que sempre desejei, mas agora faltas tu. Faltas tu para matar a sede que nunca mais vai chegar. Faltas tu parar curar as dores que não mais vão magoar. Faltas tu para me fazer sentir o amor que nunca mais vou sentir. Faltas tu, em tudo aquilo que eu sempre desejei, e onde já não existe lugar para ti.


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