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O início, depois do fim

Cansei-me das noites. Aquelas que eu tanto desejei. As noites que traziam um copo cheio de gin, uns saltos que me faziam crescer dez centímetros, um batom vermelho que prometia deixar marca, um perfume que queria deixar saudade e um olhar cheio de promessas. Cansei-me daquilo que eu mais achava que me ia libertar. Ansiei tanto por sentir algo, qualquer coisa, que caí estiraçada no chão. A adrenalina que sentia dentro de mim, as coisas que nem começavam, nem acabavam e que entravam constantemente na minha mente, faziam-me achar que estava no lugar errado, com a pessoa errada. A vontade de abrir a janela e atirar-me sem ter a sensação de que no fim, ia ter quem me abrisse os braços fazia-me crescer água na boca. A liberdade faz-nos ganhar asas, mas apenas na nossa imaginação. O poder de podermos fazer aquilo que achamos que queremos sem ter de pensar em outrem, dá-nos vida. Faz-nos crescer centímetros, ganhar anos, mas é tudo imaginário. As borboletas na barriga, os tremores nas mãos, são como orgasmos mentais, mas tal como os reais, só duram alguns momentos… e acabam. E a diferença entre estes, é que nem dá para ficar a desfrutar. Faz-nos subir ao nível mais alto em segundos, mas quando chegamos cá abaixo o vazio é tão grande que só queremos desaparecer. No amor, não funciona assim. No amor, sentimos todos os dias a mesma coisa, mas é todos os dias diferente. São sempre os mesmos olhos, é sempre a mesma boca, é sempre o mesmo abraço. Mas por dentro, é sempre algo de tão diferente. Faz-nos lembrar o porquê de estar ali todos os dias, a somar, e a somar e a somar. Isso sim, são as verdadeiras borboletas, mas em estado de metamorfose. Numa coisa eu estava certa, eu estava no local errado, com a pessoa errada. Ali, já não havia nada que nos matasse a sede, chegamos mesmo a perdê-la por completo, mas lembrávamo-nos da sensação de pedir água, e então, achávamos que tínhamos de continuar ali, sentados, à espera que caísse uma gota, que ambos sabíamos que não ia chegar.

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